Ela era afeita aos rituais. Todas as manhãs acordava com o despertador tocando, olhava pra ele e pedia mais 5 minutinhos de soneca da preguiça.
Por fim levantava e ia pra janela olhar o dia, seus olhos ardiam de acostumar com a claridade já intensa desse alto verão. Café, seu cérebro ordenava. 
Água pra ferver, pó no coador, grandes goles d'água enquanto esperava o zumbido da chaleira anunciar que estava pronto.
Então ia pra varanda, pegava os jornais, o café, água e acendia um cigarro.
Ainda em estado de semi-consciência, tentava descobrir se ainda estava sonhando, se aquilo era real, ou se tudo não era assim mesmo, a vida como um estado de realidade compartilhada. Antes do acontecido, ela tinha mais certeza de que aquilo era uma verdade, embora fosse um sonho, mas descobriu agora ser passageiro. Talvez por isso andava dormindo muito ultimamente, vivia em uma letargia e com um cansaço que a paralisava. Sorria mais no sonho, ou era a realidade? Estava difícil definir um do outro.
Então decidiu escolher a realidade que fizesse constante seu sorriso no rosto, embora algumas pessoas não conseguissem compreender que a subjetividade do que é real pra cada um, possa ser definido de acordo com o gosto do freguês. Os mais céticos chamam isso de loucura ou numa linguagem mais técnica, esquizofrenia.

 Ela preferia chamar de *meu mundo particular! 

Alice era uma moça de fino trato.
De gestos delicados e fala doce, assim era Alice.
Suas frases sempre começavam com Por Favor e se complementavam com um Muito Obrigada.
"Por favor tia Dorinha, me passe o sal."
"Primo Olavo sempre me ajuda a descer as escadas, muito obrigada!"
Não tem quem dissesse que Alice não era moça pra casar, moldada às boas maneiras, prendada e de pensamento irrepreensível.
E Alice era mesmo, em todos os momentos, até fechar seus olhos.
Alice tinha um segredo. Cedo descobrira que ao cerrar suas pálpebras ela estaria livre para fazer tudo o que lhe aprouvesse.
No mundo de Alice, tia Dorinha era vítima de suas brincadeiras. As coxas gordas de tia Dorinha assando lentamente em alho e sal.
Tia Dorinha tendo os dedos costurados pelas cutículas a cada vez que tentasse repreender alguma atitude de Alice. Tia Dorinha com os olhos grudados com cola quente, cílio a cílio, para que pudesse entender o mundo de Alice.
Alice podia fazer o que quiser, com quem quiser, num piscar de seus olhos. Alice gostava de brincar também com primo Olavo, moço muito polido, discreto e de difícil interpretação.
De olhos abertos, primo Olavo era apenas o primo de infância, quase irmão. Já de olhos fechados..
Primo Olavo ajudando a descer as escadas, Alice o encosta contra a parede.
Primo Olavo cumprimentando com um suave beijo no rosto. Alice o pega entre suas mãozinhas, sempre delicadas, e leva seu rosto até seus seios.
Primo Olavo elogiando seu vestido, enquanto Alice arranca sua camisa muito bem engomada.
Alice abre os olhos, tia Dorinha sempre pergunta onde é que Alice estava que já fez a mesma pergunta três vezes e ela não respondeu.
Sempre muito delicada, Alice se desculpa singelamente dizendo que estava rezando uma Ave Maria.

Ando recolhida. Coloquei junto a mim uma xícara de café, algumas músicas suaves, revirei minha estante em busca de livros que me trouxessem paz e fechei a porta do meu quarto por tempo indeterminado ou até eu me cansar da minha presença.

Alterando entre momentos de pura monotonia com epifanias que me parecem genias por quase um segundo, vou permanecendo em minha reclusão. Até me vir algumas questões. Por que se recolhe? Do que se esconde? É uma fuga necessária ou exatamente o que eu precisava para repensar coisas que vinham me incomodando há tempos? É o momento de sair do entorpecimento e tentar encontrar respostas ou somente colocar pra fora o que pesa aqui dentro?
É peso ou drama?
É drama ou hora de impor minha vontade? Dizer não ao que não concordo, falar do que não me satisfaz, não me representa e que eu considero abusivo?!


...


Me sinto deprimidamente reprimida.
Me deprime o quanto eu tento seguir padrões em que não me enquadro. Me deprime o fato de eu querer segui-los ainda assim.
Reprimo minha vontade de não ser simpática com pessoas que não me agradam num primeiro momento. Me sinto reprimida por ter que dosar a quantidades de queridos e queridas que tenho vontade de 
dizer àqueles que gosto.
Me deprimo com a quantidade de maldades que leio todos os dias nos jornais. E me sinto deprimida quando percebo que alguma maldade também não me escapa por vezes. 
Reprimo minha vontade de fazer justiça com as próprias mãos pela inviabilidade disso. E me sinto profundamente reprimida quando não escutam os meus e os dos demais, pedidos de liberdade.

Me deprimo ao perceber que a maioria dos que vivem aqui, ali, lá, não terão um futuro de igualdade, liberdade e fraternidade, tão alardeado pela revolução francesa. Me deprime meu futuro incerto.
Reprimo o que eu realmente queria fazer da minha vida, pela incapacidade dos fatos. Me reprime que a grande maioria também não possa ser/fazer.

Me deprime a incapacidade das pessoas fazerem bonito o seu amor, me deprime a não solidez com que dizem amar. Desde que o "ficar" substituiu o sentido de "corte", dos gracejos, das serenatas embaixo das janelas, me deprimo facilmente com a fluidez dos pseudos-relacionamentos.
Me reprimo o toque daquele que não conheço - e aqui abro uma questão, de como me sinto reprimida pelos outros por Não mais me contentar com os toques que não me deixam marcas, as boas -
Me sinto para alem de reprimida, quase que ultrajada, quando me impõem regras de conquista, um manual de como agir e não de como sentir, numa eterna busca do aprisionamento do outro por subterfúgios psicológicos,daqueles manuais de conquista de revista feminina. Reprimo meus sentimentos daqueles que esperam que eu aja assim.  

E finalmente, só espero que não morra deprimidamente engasgada!  


“quando lemos sobre uma bruxa sendo queimada, uma mulher possuída por demônios, uma mulher sábia vendendo ervas… acho que estamos olhando para uma escritora perdida, uma poeta anulada.” Virgínia Woolf 

Existem no meu lugar,
eu sinto.
Não consigo ver porque não mais existo,
mas eu sinto.
Existem!

E aos poucos você vai perdendo seu reflexo no espelho do outro, no princípio é um leve e quase não aparente esmaecimento, como quando ao acordar, seu primeiro pensamento desfoca do outro e você só lembra cada vez mais tarde no dia. Antes era assim que abria os olhos, depois passa a ser daqui 1 hora, depois do almoço, meio da tarde até chegar o momento que você fica dias sem lembrar.
Aquela vontade de saber como foi o dia do outro, passa ser a vontade de saber como foi a semana, depois a quinzena, o mês, até que por fim acha melhor nem saber. Então você fecha os olhos e a imagem desfoca, você demora pra enxergar os detalhes, busca uma foto e daí se lembra - aah era assim os detalhes de seu rosto


No princípio a vontade do toque era latente. As mãos, ávidas, iam sempre de encontro das mãos do outro. Andar na rua de mãos dadas era algo de extrema importância para guiar o caminho, sem o enlace das mãos você sentiria perdida na multidão. As mãos na outra me tornava crível. Até que as mãos já não procuravam as do outro, elas começaram a se procurar cada vez mais raramente ao andar pelas ruas e sem saber o que fazer com elas, procurava meus bolsos, ou cruzava os braços, na tentativa de não demonstrar a falta que o enlace nos dedos do outro faz. 
Você percebe que se tornou invisível, quando os olhares que trocam já não são mais olhares e sim piscadelas. No inicio olhar o outro é o mesmo que se prender no outro, como quando se olha algo tão bonito que a vontade é de não piscar para não perder nenhum detalhe. Tudo tem que ser apreendido minimamente, conta-se as pequenas marquinhas no rosto, sabe a localização de cade pêlo, cada pintinha.Percebe-se que sua imagem está esmaecendo para outro quando o olhar que recebe vem desviado, ao falar com você é mais interessante olhar pro que está acontecendo do outro lado da rua e quando por fim você recebe um olhar no tempo de uma piscadela, ele vem com uma névoa e não dá mais para perceber o que está por trás dele.
Finalmente você acorda uma dia e ao se olhar no espelho do outro não vê mais sua imagem refletida. Você se remexe, tenta limpar o espelho, coloca sua roupa mais brilhante e nada é refletido. Você espera com aparente (e mentirosa) calma que o espelho tenha dado somente um pequeno defeito e volte a sua função primeira - a de refletir - mas o tempo passa e nada acontece, nem um vulto do que você era antes aparece. E o tempo passa..
E o tempo passa..
Até que você ainda olhando naquele espelho na esperança de se ver, começa a formar uma imagem, no início é só um contorno de uma imagem, desfoca, vai focando, a imagem vai ganhando mais contorno, mais brilho. Você não tira os olhos dali, e o tempo passa..
A imagem se forma.
Não é mais você refletida ali!  

Não vejo futuro em nossa relação e não gosto de problemas, prefiro evitá-los.
Ao ler aquelas palavras ditas pelo objeto do meu afeto, pensei: Estou gostando de um vidente meio esquizofrênico, porque ao mesmo tempo que ele conseguia predizer que eu seria um problema, ele não conseguia prever o futuro que estava a nossa frente.
E com essas palavras fatalistas ditas em um inóspito chat da internet, ele me deixou.
Assim, de pronto, se tornou offline no meu chat e na minha vida, nem tive a chance de tentar entender a qual futuro ele estava se referindo e quais os problemas que ele via em mim.
Me via atordoada, lendo e relendo aquilo, mas como é isso? Fale a verdade, você deixou de gostar de mim? Não, ele disse. Você conheceu outra pessoa que você consiga prever um futuro? Não, eu nunca faria isso com você, ele continuou afirmando. Então que raios de futuro é esse? Qual a importância disso agora, se esse tal de futuro se constrói na vivência do dia-a-dia juntos, por que você não quer construí-los junto comigo? O futuro é importante pra mim, foram suas últimas palavras antes de me condenar ao cinza do offline eterno.
Ainda numa última tentativa desesperada de entender tudo aquilo, mandei um sms pedindo sua ajuda para digerir aquelas palavras mas não obtive resposta. O silêncio era palpável. Acho que ali ele já estava me demonstrando o não futuro da nossa relação, daí eu entendi, não é que ele não via um futuro, ele não queria um futuro entre nós. Então me calei também.
E fui me calando em todas as nossas relações sociais, as reais e as virtuais. Tal pessoa não faz mais parte da sua lista de amigos, parecia que gritava para mim o Mark Zuckerberg em pessoa. Só não consegui apagar seu número de telefone do meu celular, porque de nada adiantaria, sabia decorado e ainda não inventaram uma máquina de deletar lembranças.
Já passei por outros términos, queridos por mim e por outros, já fiquei triste, já fiz ficarem tristes, mas nunca foram confusos, sempre pensei que términos fossem claros, mesmo que se usem àquelas máximas do tipo, o problema não é você, sou eu, a gente sempre sabe no fundo os reais motivos e isso de certa forma é menos angustiante. Mas esse foi totalmente novo para mim.O mais confuso disso tudo, se é que é possível, é que nossa relação foi a mais clara que eu já tive, sem joguinhos, sem grandes complicações, eu era feliz, eu achava que ele era feliz ao meu lado. Nem no início precisei brincar de "não vou te ligar agora, vou deixar você sentir um pouco minha falta", enfim, essas coisas idiotas que fazemos quando estamos tentando conquistar uma pessoa. Quando ele queria me ver, ele procurava, quando eu o queria, chamava e ele vinha de pronto (ao menos é claro que estivesse ocupado), a gente saia, ia a festas, conheci seus amigos e gostei deles, aah droga, me dei conta agora que até dos amigos eu me separei também. É como se ele tivesse decretado que o não futuro se estende aos seus amigos também. Pena..
Não éramos aqueles casais que não se desgrudam. Detesto isso. As vezes ele saia só com seus amigos e eu com os meus, só pedia que me avisasse, e depois que acordamos isso um com o outro, não tinha problemas. Sim, é claro, a insegurança sempre bate, mas eu estava aprendendo a confiar nele, e minha experiência me dizia que de nada adiantava aprisioná-lo, então ele ia e sempre voltava para mim.
Desde o início eu já sabia que nossa relação seria de indas e vindas, ele não é brasileiro, de tempos e tempos ele teria que visitar sua família, o que me fez concordar com essa situação e querer ficar ao lado dele mesmo assim foi porque todos os dias que ele passou ao meu lado eu percebia que valia a pena. A saudade do tempo que ficaríamos distantes estava sendo paga e muito bem paga na prestação dos dias que passávamos juntos. Nunca fiquei chateada com ele, ou melhor, um única vez, que não durou um dia inteiro, e logo conversamos e acertamos tudo. Embora eu seja uma pessoa desconfiada e insegura, devido as marcas de alguns relacionamentos destrutivos passados que tive, ele nunca havia me deixado sentir um mínimo de desconfiança dele, não sei se fui enganada ou traída alguma vez, mas se fui também não importa agora, porque isso nunca me doeu, e mesmo quando ele estava fora não me permiti ficar procurando erros dele. Não fucei sua vida, não perguntava de forma invasiva todos os detalhes de festas que ele foi com os amigos, sua vida em outro país não me dizia respeito, ou melhor, sua vida em seu país eu tinha que respeitar, pois não acredito em relacionamentos que aprisionam o outro, como já disse aqui, relacionamento para mim não é pertencer um ao outro de forma egoísta, mas sim de complementariedade. Até porque somos água e vinho, ele esfria eu aqueço, ele acalma, mata a sede, eu deixo zonza, carente por mais, ele é terra eu sou fogo! (essa frase ficou parecendo letra de música cafona!rsrs)
Por três situações ele disse que me amava. Não disse para mim especificamente, ele disse muito mais pra ele, como algo que escorre pelos lábios e que não consegue segurar. Mesmo ele sendo tão controlado, como ele mesmo diz: tenho que pensar como engenheiro, por três vezes ele não conseguiu se controlar. Mas de todas essas vezes eu fingi não ouvir ou não entender, por respeito a ele. Sabia ou não tinha certeza de que ele queria realmente me falar isso, me parecia muito mais uma constatação para si mesmo, do que algo que ele tinha a certeza de querer dizer para mim. E hoje acho que foi o melhor que eu fiz, em respeito à ele.
Da primeira vez foi em um momento que ele estava com seus amigos, já deviam estar bem bebados e ele me ligou dizendo isso. Fingi não entender, usei a desculpa da barreira da lingua, ele fala meio enrolado as vezes e no dia seguinte não tocamos mais no assunto. A segunda vez veio em forma de sigla, TQM, escrita numa despedida de mensagem, que ao perguntar o que significava, ele me falou pra procurar no google, e eu vi lá: Te quiero mucho. Continuei fingindo que não entendi, porque se o google é que teria que dizer isso para mim, então é porque ele não estava pronto para dizê-lo. E finalmente a terceira vez que ele me disse veio pessoalmente, num momento de algo engraçado entre nós dois, estávamos rindo pela rua, felizes de nossa companhia e parece que escapou da boca dele, dessa vez em bom português: Eu te amo! Eu poderia ter aceitado aquelas palavras finalmente, eu queria ter aceitado e até hoje me pergunto se fiz certo de não ouvi-las, mas não o fiz. Ele disse baixinho e de forma muito rápida, talvez por timidez, talvez por não querer dizê-las realmente, então deixei o momento passar..Mas eu ouvi!

Comecei a escrever essa crônica sobre minha relação acabada, na tentativa de falar tudo o que não tive a oportunidade de falar para a única pessoa que eu queria que ouvisse. Estava me sentindo sufocada pelas palavras que ele bloqueou em meus lábios, por ele me querer muda tenho a vontade de gritar com toda minha força. Quando comecei a escrever minha intenção era extravasar toda a mágoa e a raiva que vêm dela e está me consumindo, não me deixando dormir, me fazendo ficar doente. Se eu pudesse, transformaria todas as letras desse texto em lâminas cortantes e atiraria sobre ele para que ele sentisse também como ardem essas pequenas feridas que deixou em mim. Imaginei uma crônica raivosa, tentei escrever sobre todas as suas falhas e defeitos e tudo o que eu não gostava nele para eu me sentir melhor e seguir em frente. Mas ao lembrar dos momentos que passamos juntos, fui enlevada pela ternura do seu sorriso, a delicadeza com que ele segurava minha mão e me fazia andar pelo lado interno da calçada, pela sua proteção, cuidado e carinho. Comecei a rir de soluçar ao lembrar do barulho da sua risadinha quando eu fazia cosquinha nele e da vez que eu cortei seu bife e das massagens que ele fazia sempre que eu pedia, lembrei do biquinho que ele faz ao me pedir um beijo sem pedir de fato, e de seu levantar de sobrancelha de amante latino (risos e mais risos..) E de seu olhar penetrante com aquelas sobrancelhas grossas escurecidos pelo desejo forte que ele sentia por mim e do som do seu sotaque que me fazia arrepiar ao me dizer: tranquila Marina. Das suas pernas que nunca paravam de balançar e que não me deixavam nada tranquila. Do cabelo dele todo em pé depois que tomava banho, do cheiro do seu pescoço..Aaah

"Saudade é emoção indivisível, razão incontestável para relembrar o gosto inesquecível daquela pessoa que mudou nossos passos, gestos e hoje, infelizmente nos considera gasto, empoeirado." 
Mas essa é a crônica do fim. E ele assinou embaixo na sua escolha de ser assim, então eu tive que aceitar. Em respeito à ele e muito mais em respeito ao meu amor próprio. Posso pôr fim a um relacionamento, mas as lembranças demoram um pouco mais para entender isso, tudo que posso fazer é deixar que o tempo faça o seu trabalho.
Fico me perguntando se ele sente algo ou se ainda lembra de mim ou sinta minha falta também. Embora eu saiba que essa pergunta nunca vá ser respondida, fantasio com ele aumentando seu teor de álcool em alguma festa para tentar apagar a falta que eu faço. Dele se revirando na cama a noite invadido pelas lembranças minhas deitada em seu peito e sinta falta disso. De ao flertar com outras meninas, perceba que eu não sou elas e me queira ali perto dele. Fantasio com ele lembrando dos momentos que eu escrevi aqui e sinta falta disso também. Mas são somente fantasias e eu vivo no mundo real no qual eu sou um problema a ser evitado.

De real o que me restou foi o chocolate semi amargo que ele me trouxe de sua cidade. E eu vou comendo o chocolate em pequenas raspinhas meio doce meio amargo. Porque sei que quando o último pedaço acabar, também será a última vez que eu sentirei o gosto do que é dele, em mim!

Enquanto olhava o mar numa tarde fria de um dia qualquer, a palavra melancolia ecoava em minha mente. Melancolia, a maneira romântica de ficar triste. Melancolia, melaaancolia, comecei a dizer em voz alta para mim mesma..

Sempre gostei dessa palavra, ela é gostosa de falar,enrola na língua e vai se alongando até ser dita. Tem gosto de pera doce e macia. Sei la porque..Eu sinto assim.
 O mar estava muito revolto, como se estivesse se sentindo preso ali, querendo ultrapassar aquela faixa de areia e tomar de assalto a rua dos pedestres. Eu sentada no banco de frente me perguntava se o mar teria a força suficiente para chegar até mim, as vezes pensava que ele só estava querendo assustar mesmo.. A força ele tinha, eu sei, acho que só não estava querendo mesmo..
E eu me sentia da mesma forma, mas sem saber se teria a força para me libertar caso quisesse.
Tenho passado meus dias quase sem falar, envolta em meus pensamentos ou tentando fugir deles através dos fones de ouvido ligados no máximo de uma música, ou indo malhar, porque o esforço físico abafa meus pensamentos momentaneamente, ou olhando o mar e procurando escutar o vento. E agora, nesses momentos que não consigo fugir das vozes dentro de mim me perguntando coisas que eu não sei responder, resolvi escrever.
Embora não queria cair na rede do "onde foi que eu errei?.", porque poxa vida, será que a culpa é mesmo sempre minha? Eu sei que para essa pergunta eu nunca terei resposta. E sei que para as outras que martelam na minha cabeça eu não teria a coragem de perguntar em voz alta, até porque o amor próprio que me guia, grita dentro de mim para eu ficar quieta, em silencio e não fazer alarde para a angustia que eu tenho sentido, porque eu sei que passado um tempo, ela vai passar, com ou sem respostas, ela vai passar. Então pra quê expor sua cara a tapa? Pra que tomar alguma atitude impulsiva, na espera de uma declaração de amor, isso não é um filme romântico da sessão da tarde. Finais felizes nunca fizeram parte da minha vida sentimental, pelo menos não no meu mundo real. 
Contra o silêncio não há argumentos e eu sei disso. Tirando o olhar melancólico de todo o acontecido, o fato é que eu fiquei por aqui enquanto o outro foi por ali, e foi se distanciando até esquecer o caminho de volta, ou até encontrar algo mais interessante no outro lugar ou ainda, até não querer caminhar junto comigo.
E fim!